quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

1982(4)

O Campeonato do Mundo de 1982 representou uma viragem no estilo e padrão de jogo apresentado pela selecção brasileira nos futuros campeonatos do Mundo. Nos anos seguintes ao Mundial de Espanha, o jogador atlético ganhou importância relativamente ao jogador mais técnico, originando inclusivamente que um dos lugares chaves para o desenvolvimento do jogo colectivo de uma equipa, denominado de médio – centro, ou cabeça-de área, (nome utilizado do Brasil para o jogador que desempenha esta função) fosse ocupado por um jogador normalmente caracterizado pela força cujo objectivo principal tinha por base bloquear o jogo adversário. As tácticas tornaram-se defensivas procurando as equipas ganharem através do erro do adversário, sobretudo porque nas suas formações existiam poucos jogadores com capacidade para romperem as linhas defensivas antagónicas.
As características do jogo globalizaram-se, tornando-se muito semelhante entre as selecções, cuja característica principal assentava em defender com a totalidade dos jogadores atrás da linha da bola e partir rápido para o contra-ataque. O jogo tornou-se monótono e os estilos de jogo que definiam as equipas desvaneceram-se. Antes de 1982, numa hipotética troca de camisolas das equipas num jogo entre as principais selecções, o adepto mais atento não se enganava, pois existiam estilos e padrões de jogo perfeitamente definidos e distintos como o inglês, brasileiro, alemão ou italiano.
Mas é importante debruçarmo-nos mais um pouco sobre a selecção de 1982 e analisarmos as razões da sua participação naquele mundial se manter viva na memória dos adeptos do futebol. Esta selecção para além dos grandes jogadores que possuía tinha quatro “mestres de bola”, Júnior, Sócrates, Falcão e Zico, o que lhe possibilitava praticar táctica e tecnicamente um futebol moderno, pois ao analisarmos a sua estrutura em campo verificamos que 28 anos depois a Espanha actual campeã do Mundo apresenta um sistema táctico idêntico, cuja disposição dos atletas no recinto de jogo proporciona desde logo um jogo de carácter ofensivo, privilegiando a circulação e a posse de bola o que provoca um enorme desgaste físico no adversário.
O sistema de jogo do Brasil-82 assentava num quarteto defensivo, com grande propensão para defender à zona e com os dois laterais a apoiarem constantemente o jogo ofensivo da sua equipa. Na zona intermediária forma-se um pentágono no qual dois jogadores formam os vértices da base esquerda e direita desta virtual figura geométrica. A dinâmica dos jogadores que ocupavam estes lugares, Cerezo e sobretudo Falcão, estiveram na origem da grande dinâmica brasileira. Não é comum um lugar que em muitas equipas é um preenchido por atleta com o objectivo de impedir o jogo do adversário, fosse preenchido por um armador de tamanha classe como Falcão possuia, na época o único jogador brasileiro a jogar fora do Brasil, mais propriamente no Roma de Itália.
Na frente desta dupla e num sector do campo bastante avançado distribuíam-se mais três jogadores entre o flanco esquerdo e o direito, ficando no vértice o genial Zico, alternando frequentemente a sua posição com a ala direita ofensiva da equipa, mais propriamente com o “mestre de bola,” Sócrates um jogador inesquecível para quem acompanhou o Mundial de 1982. Na frente jogava um atleta que era apoiado, constantemente por sete colegas, o que originava que o futebol praticado pela selecção fosse caracterizado pela sua expressão atacante e denominado de Futebol-Arte pois a qualidade dos atletas referidos, independentemente da posição onde actuavam marcaram de uma forma impar o estilo de jogo, continuando a servir de padrão para muitas equipas no presente.
Em torno destes atletas construiu-se algo que a seguinte citação expressa o esplendor e a classe impar do jogo da selecção ficando gravada na memória de todos os adeptos do futebol.
“ Os que viram puderam constatar algo mágico, a materialização de nossos desejos mais puros em relação a tudo que entendemos e sonhamos com a arte do futebol. Essa noção irremediavelmente traz consigo a dura realidade que nos faz lembrar aquela perda como uma tragédia “ a tragédia do Sarriá “ (antigo estádio do Espanhol de Barcelona) uma dor que marcou uma geração a qual obscureceu para sempre o nosso futebol. Não é por acaso que nunca mais tivemos uma selecção que consiga encantar o Mundo como em 1982, a perda daquela copa não significou apenas uma derrota do Brasil para a selecção da Itália, mas um marco onde o futebol arte foi suprimido pelo futebol força”[1].
[1] http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/2781847

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